terça-feira, 27 de maio de 2008

Culto Cristocêntrico, ou Antropocêntrico?

Santa Ceia

A Santa Eucaristia é o centro do culto cristão e da vida da Igreja, têm sido assim desde os primórdios da Igreja, onde a cristandade nesta comunhão de altar torna-se una com todo o corpo de Cristo.
Cada pastor realmente comprometido com a obra de Deus deve zelar para que o verdadeiro sentido do Sacramento do Altar permaneça presente entre os seus congregados. Entretanto, como escreve Hermann Sasse[1]:

“Os cismas e heresias (...) se fizeram notar primeiro na celebração da Ceia do Senhor. É digno de nota que estes cismas, e a decadência do sacramento levaram os apóstolos a tratar do assunto(...)”.

Esta observação de Hermann Sasse parece bastante atual se considerarmos a grande possibilidade destes cismas e heresias gerarem influências ainda hoje no meio cristão. E não seria surpresa que a cristandade atual também estivesse experimentando constante decadência da vida sacramental.
Verdade é que a sã doutrina cristã tem sido atacada de todos os lados por novas doutrinas que se espalham como poeira no vento. Como por exemplo, uma das doutrinas ensinadas pela Igreja Pentecostal Deus é amor, e por tantos quantos crêem assim, (fonte http://www.ipda.org.br/ ) ensina a teologia dos super crentes, onde segundo esta doutrina um cristão não pode adoecer fisicamente, exceto se estiver em pecado. A teologia da prosperidade da Igreja Universal do Reino de Deus (fonte http://www.igrejauniversal.org.br/ ) ensina que a resposta para solução das suas necessidades financeiras se encontra em você mesmo e na maneira como você administra os seus dízimos e suas ofertas. A teologia da oração positiva de Norman Vincent Peale expressa em seus livros, ou espalhadas pela internet
fonte(http://jrobertopeixoto.sites.uol.com.br/ ) ensina que tudo na vida cristã depende de seu pensamento positivo no momento de oração.

Que o alvo principal dos que produzem tais novidades freqüentemente tem sido o Santo Sacramento do Altar isto fica claro quando percebemos o que há em comum entre estas doutrinas: o fato de que todas elas apontam o homem como a própria fonte de todas as bênçãos bastando apenas que o homem se determine e fortemente queira aquilo que ele almeja. Ou seja, não precisamos mais recorrer a fonte de vida que é o corpo e o sangue de Jesus, mas tão somente apegarmo-nos firmemente a nós mesmos. Para todos os que se apegam a estas novas doutrinas a Ceia já não é o centro do culto cristão. Se a presença de Cristo é real ou não, para todos os que crêem como exposto acima, isto já não importa visto que agora a Ceia torna-se um memorial em forma de prêmio para aquele que se comportou bem durante o mês e agora merece participar da mesa do Senhor.
Com tristeza constatamos que o ser humano quando dá asas a sua imaginação, produz os mais diversos tipos de teorias. Apegado ao que ele mesmo concebe, substituindo a verdade pelas suas próprias mentiras, o homem chega mesmo a opor-se a Deus, ainda que isto lhe custe à própria salvação.

De acordo com o pensamento do Rev. Horst R.Kuchenbecker[2]:

“Mesmo vendo ainda sinais do cristianismo em todos os lugares, vemos pouca vida cristã. Poucos são os que vivem e confessam a verdade que Jesus afirmou: “O meu reino não é deste mundo (Jo 18.36) ” No lar e na igreja há pouco ensino das verdades fundamentais. Estamos resvalando de um culto cristocêntrico para um culto antropocêntrico,(...) O vácuo produzido por tal desvio da verdade é preenchido pelo esoterismo e / ou cultos recreativos.”

Estamos vivendo em um período de crescente descaso com a doutrina verdadeira, e isto têm se tornado um veneno no meio da cristandade. Vemos isto claramente no meio da própria igreja, e é claro, isto reflete negativamente em nossas escolas, nossos clubes sociais , enfim na sociedade em geral, que já não reconhecem mais os valores cristãos como base e fundamento para nortear suas atitudes.
Na verdade, a decadência do verdadeiro ensino cristão, e em especial no que se refere ao Santo Sacramento do Altar, corresponde à decadência da própria igreja. Que isto é um fato real comprovamos quando observamos atentamente o que igrejas como as citadas acima ensinam não somente quanto a Santa Ceia, mas nas diversas doutrinas estabelecidas e aceitas como correta exposição dos textos sagrados. Tais denominações ocupam-se de acomodar os ensinamentos bíblicos à sua realidade, ou seja, ao invés de conformarem-se com as doutrinas que Deus já nos revelou na Bíblia, criam suas próprias doutrinas a custa de uma verdadeira ginástica hermenêutica e exegética, e então empurram suas conclusões para dentro dos textos sagrados na esperança de que Deus os aceite como Seus.
Ocupando lugar de destaque, o Sacramento do Altar é, sempre de novo, alvo de controvérsias. E é ai mesmo que a cristandade deve saber se posicionar. É aprendendo a combater as controvérsias e firmar sua posição naquilo que é a correta expressão da vontade divina. Evidentemente nós como igreja confessional não podemos calar diante destes fatos. Não podemos simplesmente ficar ausentes. Este é um desafio do presente, do qual é nosso papel assumirmos postura coerente com a nossa realidade e principalmente como Igreja de Cristo.
De fato, este problema, o enfraquecimento da compreensão correta da doutrina bíblica concernente ao Santo Sacramento do Altar, não é novo, todavia o que deve nos preocupar é como os nossos congregados têm se portado diante desta situação.
Para Hermann Sasse³ por exemplo, toda enfermidade da igreja se torna manifesta à Mesa do Senhor. Entretanto, para que possamos nos posicionar a respeito deste tema fora de nossas portas, é necessário primeiro reconhecermos em que situação estamos nós como povo cristão. Não só nos importa saber que pertencemos a uma igreja séria enquanto instituição, mas importa também que possamos afirmar fazer parte da Igreja verdadeira cujo único e suficiente Pastor é Jesus Cristo.
Como estão neste sentido nossas congregados? Devemos nos preocupar? Apesar de todos os nossos esforços, existe tal situação em nossas congregações? Temos sido vítimas deste enfraquecimento no real conceito de Santa Ceia?
Vale lembrar que o objetivo deste trabalho não é criticar, mas sim conduzir-nos a uma reflexão sobre nossas congregações e suas perspectivas sobre o Sacramento do Altar.

Santa Ceia – Breve histórico

Certamente que a origem da Santa Ceia se dá no exato momento em que o próprio Cristo a instituiu, a saber: na Quinta-feira Santa no momento em que Jesus Cristo juntamente com seus discípulos celebravam a Ceia pascal.
Este episódio é o cumprimento das promessas de Deus. Em Jeremias 31.31ss.: “Eis aí vêm dias, diz o Senhor, e firmarei nova aliança... não conforme a aliança que fiz com seus pais”. “... Pois, perdoarei as suas iniqüidades, e dos seus pecados jamais me lembrarei”. Em Hebreus 9.10, lemos que já chegou o “tempo oportuno da reforma”. Torna-se necessária à reforma da “anterior ordenança, por causa de sua fraqueza e inutilidade (pois a lei nunca aperfeiçoou coisa alguma) e, por outro lado, se introduz esperança superior, pela qual nos chegamos a Deus”. Hb 7.18,19. Cristo é o mediador da nova aliança, Hb 9.15.
No centro do Sacramento do Altar está o sangue de Jesus Cristo, selo da Nova Aliança, o sangue do cordeiro de Deus, “porque onde há testamento é necessário que intervenha a morte do testador”. Hb 9.16.
Entretanto, é interessante notar que desde sua instituição até os dias de hoje, este sacramento tem sido alvo de controvérsias.
De acordo com o que nos mostra a própria história, a Igreja verdadeira, aquela fundamentada nas palavras do próprio Senhor Jesus, vem sofrendo constantes ataques de denominações religiosas, como as de cunho calvinistas, por exemplo: Igreja presbiteriana do Brasil, Igreja Batista de Sétimo dia, Igreja Adventista do Sétimo dia, Igreja Internacional da Graça de Deus, Convenção Batista Brasileira, entre outras, que advogam para si o direito de interpretar as palavras desta aliança firmada pelo Senhor, conforme sua própria vontade e inclinação.
Se voltarmos no tempo apenas até a época da reforma já teremos aí material histórico suficiente para termos uma clara noção do que tem sido esta luta contra a verdadeira Igreja cristã[3]: mestres zwinglianos de um lado disseminando seu erro sobre este sacramento, de outro lado mestres luteranos apegados a sã doutrina cristã. Entre ambos uma só questão: se na ceia o verdadeiro corpo e sangue de nosso Senhor Jesus Cristo estão verdadeiramente e essencialmente presentes, são distribuídos com pão e vinho e recebidos oralmente por todos aqueles que fazem uso deste sacramento.
Ao longo dos tempos esta questão tem sido respondida de diversas maneiras[4]: Cristo não está presente, pão e vinho apenas representam o corpo e sangue de Jesus, tudo é um ato comemorativo, meramente simbólico, dizem a maioria dos entusiastas; pão e vinho transformam-se em carne e sangue, que inclusive devem ser adorados, ensinam os papistas; por outro lado, os calvinistas e a maioria dos reformados ensinam que já que seu corpo não pode estar presente aqui na terra, e ao mesmo tempo, em tantos lugares diferentes, onde quer que se celebre a Santa Ceia, afirmam então que Cristo está presente conforme a fé de cada um, onde a boca recebe pão e vinho e a alma se eleva ao céu e recebe Jesus Cristo pela fé.
Na mesma época, século XVI, em meio a tais controvérsias, e com o claro objetivo de estabelecer o correto ensino sobre muitas matérias que eram alvos de polêmica por parte dos que abandonaram a verdade em troca de ensino fantasioso e ante-escriturístico, F. Melanchthon redige a Apologia da Confissão de Augsburgo[5], e no seu capítulo X trata do tema em questão afirmando que:

[...] confessamos crer que na ceia o corpo e o sangue de Cristo estão presentes verdadeira e substancialmente, sendo oferecidos verdadeiramente com os elementos visíveis, pão e vinho, aos que recebem o sacramento. [...]

Tal declaração, por ser a correta exposição do ensinamento bíblico, deveria nortear ainda hoje o pensamento e compreensão de cada cristão, e de todos aqueles que fundamentam a sua fé na verdade.

Rev. Ari Fialho Júnior
Teólogo Luterano
Soli Deo Gloria!

[1] Sasse, Hermann. Isto é o meu Corpo – Porto Alegre, Casa Publicadora Concórdia, RS, 1970, p. 2.
[2] Kuchenbecker, H. R., A importância e necessidade da formação de Pastores, Professores e Leigos, Vox Concordiana, vol. 17, número 1, ano 2002, pág. 56 “1)A Secularização e as religiões do presente”.
[3] Goerl, A. Otto – “Cremos por isso também falamos”. Fórmula de Concórdia. Publicado pela Concórdia S. A. – Porto Alegre, 1977, pág. 79.
[4] Goerl, A. Otto – “Cremos por isso também falamos". Fórmula de concórdia. Publicado pela Concórdia S. A. – Porto Alegre, 1977, pág. 81, 82.
[5] Melanchton, Filipe. “Apologia da Confissão de Augsburgo”. Casa Publicadora Concórdia S. A., 1969, pág. 96.

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